Skip to content

Categoria: Contos

Buz

A View from My Window – Jan Saudek

Silêncio.
Ele estava parado a admirar o céu pela janela. Seu gato lhe roçava as pernas, enquanto respirava fundo aquele ar frio de um dia ensolarado.
A luz do sol entrava de leve, batia em seu rosto fazendo seu olho direito brilhar. Os raios de luz escorregavam pelo seu peito com pelos ralos. As suas costas arrepiadas pelo o vento salientavam a curva de seus quadris que findava numa bermuda jeans rasgada.
Seus pés fixos no chão lhe davam um caráter sólido. Estado contemplativo.
Não pensava em ‘o ques’ ou ‘porques’, apenas olhava ao longe um horizonte azul, seus lábios rosados, mesmo imóveis, pareciam gritar poemas e palavras de acalanto. Seu mamilo saltava como que pedindo o contato da língua.
Barulho.
… Sempre olhamos quando uma porta se abre.
3 Comments

Malas

Lembra-se do fone de ouvido preso na vitrola que gritava as melodias do passado e os riscos dos discos? Lembra-se da fanta que coloria a língua e da tubaína na garrafa de cerveja?
Você pensa no laço que eu te dei? Do beijo atravessado entre os olhares lascivos? Da madrugada perdida abraçados no carro? Lembra-se de eu te pedir aquela música? Ou talvez de quando te vi risonho naqueles bares da augusta?
Lembra pelo menos de quando te despi sem pressa na bagunça do meu quarto?
É duro te ver partir sem levar as malas e memórias.
1 Comment

Aquela Casa

No meio de um intenso labirinto feito de folhas verdes existe uma casa. Uma casa serena, cálida e calma. Ali dentro afastada de tudo e de todos, só é possível chegar após muito esforço.
Dentro da casa quem diria. Uma lareira e mensagens de boas vindas era acolhedor afinal aquele casebre antigo. Uma paisagem oposta aos espinhos e venenos postos do lado de fora, ao longo do labirinto. Nas paredes da casa quadros pintados e pregos ainda vazios. Uma música boa tocava ao fundo e em cima da mesa uma taça de vinho do porto para expressar o gosto do sujeito oculto.
Eram três quartos ao longo do corredor que se encontrava no final da sala, no primeiro brinquedos antigos, puídos, uns de madeira e outros de pano. Alguns estavam manjados do tempo, o tempo sempre deixa suas marcas pintadas em tom sépia. No segundo quarto uma cama apenas, o resto vazio, era larga de lençol branco e macio, ninho intacto e sem janelas, coisa essa que ainda precisava ser construída. No terceiro quarto uma alegria invadia, eram balões e confetes que minavam das mãos de pessoas sem faces.
A casa todo cheirava a chá com biscoitos, não era nem quente nem fria, era na medida certa confortável e aberta para o vento tocar por carinho levemente a pele. Era como um abraço de saudades após anos de distância ou o primeiro beijo de enamorados que soltam faíscas.
Não era lá uma casa muito engraçada, mas era tênue, leve e amada.
1 Comment

Dora

Ela usava uma saia cumprida a lhe contornar os quadris. Seus cabelos caindo em fitas entrelaçavam-se nos meus dedos largos, eu respirava seu cheiro de orvalho e salgava a boca a cada beijo.
Uma luz ascendente contornava sua pele lisa com uma pelagem rala e o contorno de sua boca vermelha marcada a giz de cera e papel de menino.
Corria, sorria e suava. Vi-te passar ainda menina na rua e hoje mulher te ponho nua. Doce feitiço, tênue olhos de ametistas. Fala-me segredos leitosos no canto da boca. Respiro e me calo.
1 Comment

O contador de nuvens

Foto por Leco Vilela

Ele andava distraído como quem conta as nuvens do céu, caminhava pelas ruas desertas de uma cidade cheia de vidas. O sol lhe batia leve no rosto transformando seus olhos em faróis castanhos a ilustrar seus passos. Um sorriso leve lhe dominava a face.


Andava com as mãos nuas a balançar como um pêndulo para fora dos bolsos. O movimento hipnotizava o olhar do outro. Este caído pela beleza dos faróis castanhos, se viu obrigado a seguir os passos daquele que o encantaram. Passos rápidos e respiração ofegante. O admirador hipnotizado alcançou o contador de nuvens através do toque, um leve toque nas mãos.

Recebeu o toque sem susto, olhou através do olhar de seu admirador e sorriu. Sorriu como se já conhecesse o toque que se fazia presente. Entrelaçaram os dedos e caminharam juntos pela cidade vazia.
1 Comment