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Categoria: Crônica

Curvas

Às vezes sentado na sala escura me pego a pensar na estrada. De como é bonito ver o sol colorir as nuvens e como é bom se deixar levar pelas curvas sinuosas do asfalto. O verde que corre de costas pelo vidro do carro, a mão que brinca de peixe no vento, a cabeça que vai e volta em inúmeros pensamentos e aquele sono gostoso que pesa os olhos e alivia os ombros.

Anseio pela viagem e pelo desconhecido. Acho incrível a capacidade de algumas pessoas de saírem de suas casas com uma mochila, um bom sapato e muita coragem. Não vejo esse tipo de viajante em mim. Nunca foi de acampar ou de pegar caronas na estrada, mas isso não diminui o valor do caminho.

Muitos falam que a estrada é solitária, li isso em muitos livros também, mas a verdade é que a estrada recebe a todos que nela pisam. Claro que receber não é zelar, a estrada não pode se preocupar com o suor da sua testa ou o calo do seu pé. Nela você aprende mais sobre você, não só limites, mas também sentimentos e dor.

Nós passamos muito tempo fugindo da dor, nos dopamos na esperança que ela desapareça, mas no fim das contas, ela continua lá, a gente que vai aprendendo a ignorar. Dizem que isso faz de você alguém mais forte. Eu ainda acho que forte é quem encara a dor nos olhos, resolve as coisas e sai andando. Sei que isso pode ser mal interpretado e encarado como falta de educação, mas pense bem, educação de quem? Quem te ensinou a ignorar a dor?

A estrada não é feita de caminhos fáceis, talvez por isso ela me fascina tanto. Afinal nunca fui normal e sinceramente, nesse meu quarto de século, considero isso um elogio.

Qual o propósito da estrada? Ela é uma imagem densa, sem dúvida, um signo forte de liberdade, força e rompimento.  É como a esfinge de Tebas, é necessário decifrar ou se deixar devorar.

A estrada não se trata de uma fuga, se trata de um adeus.

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3 de Copas

Eram três andando pela rua. Sorriam.

Caminhavam entre os prédios altos e as ruas estreitas da capital, a sombra dos prédios mantinha o caminho gelado, assim como a chuva provocada pelos inúmeros aparelhos de ar condicionado.

Já tinham quase trinta, mas ainda eram crianças, empurravam um ao outro como quem, por graça, faz o outro perder o equilíbrio. Eram amigos, confidentes… amantes.

Encontraram-se há pouco tempo, antes disso andavam separados a procura de um, mas foi nas curvas do dois que acharam suas metades. Definitivamente eram plural.

Na rua andavam sem medo, viviam acima de tudo. O povo em volta por sua vez temia. De alguma forma a existência daqueles três os amedrontava, o desejo de expurgar aquilo do todo era maior, maior que o amor que poderia existir fora dos limites da normalidade.

Aqueles três não eram homens ou mulheres, eram apenas crianças com seus quase trinta.

Os prédios não são feitos para as crianças.

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SacoCheio.com


Frida Kahlo

A verdade é que eu fico horas atualizando a timeline na esperança de que algo incrível acontece, de que alguém incrível me conheça, de que talvez o universo desapareça.
Conto quantos seguidores eu tenho, quantos amigos mantenho, quantos + se agrupam nas minhas produções. São likes que se tornam dislike. Na vida real não existem downloads.
Eu espero aqui sentado que a vida acompanhe meus dedos e se torne algo interessante a ser contado. São mais de vinte palavras por segundo.  “Oi, tudo bem? Novidades?” e aí está o começo de boa parte das minhas conversas.
Tem as caras no livro, tem os piadores, tem os compulsivos por murais e é claro tem os ouvintes crônicos. Ta ficando um pouco chato isso tudo.
Tá ficando sem graça isso tudo.
Tá broxando a cada tecla.
Tá desaparecendo.
Tá indo.
Foi.
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Dragões de fumaça

http://www.flickr.com/photos/leonardovilela
Pela janela eu vejo os pássaros voarem. Me deparo com o meu reflexo e as lembranças do passado se materializam quando a minha iris encontra a iris da minha imagem.

São quinze para o meio dia e minha mente viaja. O barulho do motor ainda não venceu o cantar dos pássaros. Minha boca seca pensa no corte igualmente seco da minha história. Sempre fui de matar dragões e isso te deixa meio áspero. Talvez por isso memórias se tornaram afago.

Não sei ao certo em quanto tempo o sol vira lua, mas sei que durante esse tempo imaginário minha vida se desfez e nasceu de novo por diversas vezes. Águas passadas sempre caem no mar, salgam a boca e viram ondas de crista branca.

O volume dos carros começa a vencer o dos pássaros.
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Ausência

Rio Tietê – São Paulo, SP
Ando sem inspiração ultimamente, ou talvez seja aquele bloqueio criativo que todos falam. Mesmo assim, eu tenho por hábito escrever, mesmo que seja o que está passando pelo minha cabeça, sem a necessidade de um apelo estético durante o processo.

Acho engraçado como as coisas são hoje em dia, os inúmeros recursos da comunicação tornam cada vez mais necessário que tenhamos algo a dizer. Uma opinião sobre algo. Uma versão de um fato, e sendo assim como alguém pode não ter sobre o que escrever?

São nuvens cada vez maiores e mais intensas. Eu sentado na frente do teclado e simplesmente não tenho nada a dizer. Talvez seja isso, talvez seja a falta de assunto em meio a tantas histórias. Talvez seja interessante escrever sobre não ter o que dizer… Será?

Bom, acho que vale a pena arriscar, afinal ninguém pode me culpar por não ter nada a dizer quando todo mundo já diz algo. Os assuntos é que estão gastos. Vou deixa-los descansar para depois ter o que falar, é isso, deixar o assunto respirar para só depois ter o que dizer.

Que música boa essa que tá tocando… Pera. O que eu estava pensando mesmo?

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