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Categoria: Crônica

Mendoza


Ele balançava a taça de vinho como quem conduzia uma dama pelo salão. Fred Astaire por um momento, pelo menos foi o que pensou. Segurava a ‘moça’ com vigor e segurança.
Ele observava as gotas que escorriam por aquelas curvas. Levava-a até a boca e embriagava-se um pouco mais. Aroma de frutas com notas de chocolate.
A música no salão se espalhava, seu pé subia e descia e seus olhos garoavam conforme sua bochecha se enrubescia pelo malbec de 2011.
Lembra-se de Allen Ginsberg? Pergunta para si e sorri.
A banda pausa enquanto ele escreve.
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Pronomes

Ele desejava Você. Ele, embora calado e sorridente, queria mesmo é ver Você sem roupa, de quatro e gemendo, enquanto Ele com a língua ia da nuca pra baixo.

Você ficava ali, sem tempo, correndo e morrendo aos poucos. Você sorria, e às vezes Ele imaginava que esse sorriso era só dele. Você ali parado com o coração no braço.
Ele só queria sentar com Você e contar as coisas de uma viagem a toa, beijar a boca, tirar a roupa e ver Você dormir.
Ele só queria comer Você e era só Você que Ele queria comer.
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Outros Aires

Foto por Leco Vilela


Sono agitado, coração acelerado, curiosidade a mil. O avião decola. Três horas depois, outro país, outra cultura; latinos iguais, mas completamente distintos. Seus rostos mais europeus do que os nossos, sua língua rápida e cheia de expressões e fortes articulações.
É da janela do ônibus, que me tira do aeroporto, que vejo os prédios correrem pra trás. Um ar decadente se espalha por Buenos Aires. Charmes antigos e mal conservados nas periferias da capital.
Muitos passos e muitas esquinas depois; lá vou como gosto de estar, caminhando com minha câmera na mão. Sacando histórias e contanto imagens.

São dezoito horas, a 9 de Julio se enche. Barulho. Mesmo assim as ruas não param, o ar se respira e a beleza se instala. Cidade pós-apocalíptica.
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Cinza

Leco Vilela

Não existe mais contraste entre os prédios e o ar se torna visível de tão pesado. Essa nuvem cinza que domina o inverno paulista sufoca.

São Paulo nunca foi cheia de cores, mas no inverno seco a cidade se reflete anêmica. Quando chega à tarde, o Sol só faz doer os olhos. Não sinto minha pele áspera aquecer.

Não existe horizonte nas manhãs do inverno paulista. 

Existe o motor e a fumaça, a velocidade e o concreto, o vertical e o cianeto. 

Nem os pássaros compõem melodias. Orquestras.

E mesmo entre a pele arrepiada pelo frio e a morte que se apresenta nas folhas caídas no chão, tem um Ipê que pinta em cores a tela cinza.
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Sozinho

Derek Fernandes

A chave penetra na fechadura e gira. A sala mal iluminada com algumas roupas jogadas no sofá tem um cheiro de lugar seguro. Ninho. Ele joga sua bolsa no chão e tira a camisa enquanto anda pro quarto.

Amanhã é dia de lavar a roupa, acusa o balde de roupas sujas. Ele chuta os tênis velhos para debaixo da cama e faz cestas com o par de meias, abre o zíper e a calça escorrega silenciosamente sem se importar com os pêlos da perna. Vai até o rádio e aperta o PLAY. Ele arranca a cueca e caminha pelado para o banheiro, o barulho da urina no vaso o diverte.

Liga o chuveiro e ergue a cabeça para que as primeiras gotas caiam sobre sua testa, ele gosta de sentir as gotas passeando por todo seu corpo. Ele encosta a testa no azulejo frio e deixa a água livre fluir. O sabonete se dissolve em pequenas bolhas limpando sua pele suada, retirando dele seu cheiro de homem usado.
Ele deixa a toalha secar seu corpo enquanto o vento frio lhe arrepia a pele. Cai nu na cama e se deixa adormecer enquanto a música toca.
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