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Autor: Leco Vilela

O texto sem fim

E se eu estivesse preso a algum conceito ultrapasso de felicidade? E se o mundo não fosse aquilo que eu sempre pensei que fosse.

Sou uma roleta russa, uma arma, uma bala e muitos lugares pra ir.

O peso de se fazer o que se ama.

O que se ama?

Seria errado ainda não saber o que se quer ser quando crescer? É muito “erre” numa frase só.

Penso de mais sobre essa tal estabilidade e mesmo sabendo que é uma farsa, eu não sei como ignorá-la. É persistente e permanente. O tambor roda e na minha testa o gelado do cano anuncia, sem bala.

Quando eu acho que eu me encontro, logo percebo que me perco. Silêncio.

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Sou

Sou aquele que não chora e que não pode chorar.
Sou aquele que te entrega a rosa, mas nunca recebe.
Sou aquele que assim como outros milhares, apenas fornece o pão.
Sou aquele que quando o pau falha tem a identidade roubada.

Sou aquele que sempre precisa estar ereto, mesmo quando não tenho vontade. Sou o mágico ser que está sempre pronto para te atender nos seus anseios e desejos, mesmo quando eu não tenho vontade. Sou o ser que só goza, mesmo quando eu não tenho vontade.

Eu sou um homem que como outros homens, fui limitado. Você veste minhas roupas enquanto eu só posso ficar nu.

Sou o sexo forte, que supostamente deveria arcar com a vida de uma família, mesmo ainda sendo um menino. Sou o forte que viu milhares de iguais morrerem nas trincheiras. Sou aquele que diante da morte deve entalar as lágrimas e cavar a fossa.

Sou a pessoa que há 2013 anos está presa a convenções que me incitam a digladiar. Sou aquele que é medido por números, posses e centímetros. Sou apenas um velho rico, um garanhão jovem e uma conta corrente ativa.

Sou eu que mesmo sofrendo com a vida que levo, devo engolir o choro e nunca!… NUNCA! Mostrar-me frágil, correndo o risco de ser exposto ao ridículo julgamento social e ser tomado como fraco, não importa quantos leões eu tenha matado.

Sou pai, filho, avó, primo, tio, estranho, homem do saco, palhaço, bandido, marido, neto, padrinho, afilhado, sobrinho, puto, vadio, viado e bicho.

Carrego na minha garganta o sinal da minha maldição, osso do meu antepassado, que pra não ficar sozinho, cedeu até uma costela.

Sou o deus de uma sociedade hipócrita, que não aguenta mais os espinhos.

**Texto produzido para a terceira edição da Revista Rosa.
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Entre cores e contrastes

Houve um tempo em que em minha inocência eu levava tudo em preto e branco, dicotomia simples e direta. Assim levava minha vida, objetividade dura. Sem nuance e sem profundidade na trama, corria pra que o tempo de amanhã chegasse antes do final de hoje.

Eu costumava terminar coisas antes mesmo de começa-las, amores, filmes, livros. Devorador inquietante. Vivia entre muros concretos buscando a não dor. A ausência do sofrer. Pasmem, mas pessoas que muito sofreram tendem a não querer sofrer mais. E nesse esconde-esconde de mim mesmo fui percebendo que ao fugir do sofrer eu me privava de vida. Autoflagelação. Ao fugir da dor eu mesmo a aplicava na veia.Primeiro eu mudei de muro, fui pra longe, pra muros novos. Depois comecei a derrubá-los aos poucos e deixando a luz entrar e banhar meus olhos.

Quando acostumados com a dureza do preto e branco, os olhos doem ao ver a luz.

 

Resumindo a ópera, o próprio caminho do rompimento com a parede dura causou lesões, cicatrizes que viraram sabedoria. Vida e tempo, amantes perfeitos quando se tem paciência. Vivi e estou vivendo.

Mesmo sabendo que o amanhã não será doce, escolhi aproveitar o amor que me vê nos olhos. Existe um certo peso em ler as linhas que ninguém vê. Assumi pra mim as cores, que aos poucos tocam minha pele nua na manhã de um novo dia.

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Noites

Existem noites em que quero escrever pra ti, mas não consigo, não é que não te ame ou não te deseje. Reverso disso. Te quero tanto que algo me impede de te entender.

Um escritor perde noites escrevendo para entender o mundo e a si mesmo, é como um cego que para ver requer o tato. Escrever é um processo antropofágico.

Talvez por isso seja tão difícil preencher as linhas quando ao decorrer da noite você rouba meu edredom e sorri ainda dormindo. Pronto fui fisgado, virei menino.

Esse meu jeito torto de querer bem. Talvez seja meu ‘Vênus em Peixes’ que freneticamente canta que o amor é um robô gigante! Ou talvez sejam os doces nomes pelo que você me chama.

A verdade é que existem momentos que eu prefiro guardar na mente ao invés do caderno. Momentos só meus.

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O garoto que cansou de correr

Desde pequeno ele ouvia que era preciso correr atrás do dinheiro. Pobre garoto não só ouvia como também via a correria forte atrás desse tal dinheiro.

Cresceu vendo adultos brincando de empurra-empurra pra entrar no trem lotado, olhava querendo entender as regras desse jogo tão chato, pensava isso, pois todos pareciam irritados.

Os anos passavam e o tal garoto foi vendo os amigos planejando o futuro, alguns queriam brincar de médicos, outros construir prédios e ele não sabia ao certo o que queria, então por inércia seguia caminhando, descobrindo o mundo desbravando os pequenos sonhos que se punham em sua frente.

Já era um adolescente e a vida o forçava mais pela corrida do din-din, cinema, fliperama, namoro, comida, balada… Ele parava, olhava para tudo aquilo e parava.

Nunca fez muito sentido pra esse garoto ver tantos corredores de dinheiro com tanto medo de perder tudo que mal viam por onde andavam. Ele gostava de caminhar, de dançar, de ler e de sonhar, mas novamente por inércia correu, embora não pelo mesmo objetivo, mas correu.

Essa criança, adulto virou, e dessa vez parou de vez. Virou pro lado e deitou na grama, olhou pro céu e respirou fundo. Dormiu.

Quem ainda corria olhava e dizia mais um Zé Ninguém. Ele ali deitado sonhava, acordava, dormia, sonhava, virava, pensava, resmungava, pensava, sonhava…

Demorou seu tempo e então levantou, deu as costas pra pista e foi subindo a colina que muita gente temia, estava sem medo, sem dinheiro e sem dúvida ou dívida. Seguia, o garoto já adulto caminhou e nunca mais pra corrida voltou.

Há boatos de que ele continua um garoto que caminha, dança, lê e sonha. Enquanto os outros, pelo dinheiro ainda correm.

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