Skip to content

Categoria: Vida

Poema

Eu tenho procurado a poesia em cada esquina e talvez esse seja meu erro trágico. Poesia não se encontra em cada centímetro de rua, essa demonstração de si através das palavras, não está somente em uma parede branca e lisa.

Existem concretos tortos que abrigam um número infinito de verbos bonitos para ser mostrado. Ainda há aquele muro escuro e isolado que entre seus tijolos guarda o ritmo leve e a cadência áspera de um bom poema.

É incrível a capacidade humana de enxergar sua própria poesia em pessoas inóspitas. A capacidade de se perceber projetor é um degrau a mais na escala do tempo, espero por isso agora.

Aguardo também pelo dia em que enfim encontrarei substantivos com gosto de mar, não meus, mas  sim aqueles que reverberam leve por cada poro de um corpo sem sexo.

Enquanto esse dia não chega, me contenho com os livros, o vento e a grama molhada.
1 Comment

Paira

Eu gostaria de falar sobre o que se passa dentro de mim, sobre minha infância gritada, sobre meus sonhos confusos, sobre minhas coisas espalhadas. Existe um silêncio em mim.

Quando me olho no espelho e a dúvida paira pelos meus olhos e o reflexo turva com a minha respiração. Existe uma sombra do outro lado de mim, meu avesso, minhas loucuras.

Eu tenho caminhado cansado por entre as ruas, cantando alto aquelas músicas de chuva e bebendo vinho pra poder dormir. Minha alma inteira sem saber pra onde ir.

Minha palavra cala antes mesmo de existir. Estou seco de palavras e simplesmente, não sei pra onde ir.

Falta-me o ar.

2 Comments

Adam


Às vezes quando eu andava com nuvens escuras sob minha cabeça, atravessava a Lima e Silva e já na esquina da república um sorriso se formava, parece que meu corpo ia se felicitando conforme aqueles acordes iam entrando.

Adam tinha o poder de me fazer sorrir, mesmo quando eu estava do outro lado da rua e distante cumprimentava-o enquanto ele tocava. Escocês e seu violino, ah! Vocês deviam de ouvir quanta alegria se transmitia e como o dedo dele corria, era contagiante, eufórico e eu simplesmente sorria.

Nunca disse isso àquele grande homem, de seus quase dois metros de altura, loiro, magro e de cabelo bagunçado. Adam, o violinista, não está mais por aqui, tomou outro rumo, foi para outro lugar. Deixando-me com a minha grande falha que foi nunca dizer a ele o quanto a sua música me fazia bem.

Conversamos muito uma noite dessas, moramos até mesmo sobre o mesmo teto algumas semanas, então eu escrevo isso e espero que um dia ele saiba que sua arte ainda reverbera em mim. Não sei se um dia ele lerá este texto, então só me basta acreditar no poder da palavra.

Your talent, your music, your art make something smile on me and for that I just can say thank you a lot.

Leave a Comment

Vênus em Peixes


Lembro que quando era pequeno tinha mania de jogar a cabeça pro lado ou ainda de dar bananeira quando eu procurava alguma coisa e não a encontrava, eu olhava em lugares ilógicos como, por exemplo, encontrar o controle remoto dentro geladeira.

É engraçado relembrar isso, pois é um hábito que se manteve de forma discreta. Há pouco tempo percebi que mantinha esse jeito de ser, pois acharam engraçado eu jogar minha cabeça pro lado e olhar pra frente como se estivesse dando um zoom nos olhos. Era como se eu virasse um pinball de lado para a bolinha se desprender.

Em todo o caso esses pequenos hábitos loucos e já imperceptíveis para mim me fizeram entender que não existe uma busca por algo externo a você mesmo. É engraçado contradizer a ideia normativa de se ter um relacionamento, mas é real.

Não quero alguém que me complete, pois a metade de mim sou eu inteiro, sou e existo independente de outro ser humano, o irônico é que justamente essa percepção, que torna interessante estar com outro ser humano. Não se procura uma metade, vive-se com um inteiro.
2 Comments

Era uma casa muito engraçada


 
São fantasmas que vagam por entre minhas paredes, eu renovada, mas antiga. Muito já se passou em mim, mas hoje vivem os espectros que são visíveis pelas frestas das portas.

Imprudências, assédios, tristezas e angústias. Alegrias também aconteceram aqui, mas depois de um tempo os tijolos pesam tanto que eu sedimento. São demônios incrustados entre as camadas de tinta que me renovaram.

Existem vazamentos e lutas homéricas contra as pragas. Sou um edifício aberto, com uma luz agradável e uma brisa leve, mas os anos me consomem e embora permaneça estética minha origem se esconde entre constantes reformas.

Ouço fantasmas, seus passos e seus gemidos. Seres que transam estupidamente entre minhas paredes e ignoram minha sólida existência. Beijos trocados com outro por aqueles que usavam meus espelhos para aprender o toque dos lábios.

Às vezes avarandar, outras vezes demolir.
Leave a Comment