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Autor: Leco Vilela

Os conselhos de Caio

Caio era um homem de seus 35 anos, cabelos castanhos, mas com fios nitidamente ruivos, o que pontuava o grisalho chegando. Sem barba e com leves olheiras, Caio tinha um corpo comum.

Caio sempre foi o mais quieto dos seus primos, não que desgostasse as brincadeiras de correr, mas simplesmente preferia ficar deitado na rede vendo as coisas acontecer ao redor.

Hoje, na sua terceira década ainda mantinha seus momentos de isolamento, mas era bem disposto ao convívio social. Inclusive ganhará o título de ombro amigo, todos em sua volta confiavam nele, largos segredos e trambolhos de angústia. A sua predisposição ao silêncio permitia que sua escuta fosse ativa. Com o tempo foi se tornando cirúrgico, abria a boca quando necessário, e dessa forma arrancava verdades que muitas vezes não estavam prontas para ver o dia.

Demorou pra perceber que seus conselhos e comentários mais machucavam do que ajudavam, se tornou impaciente e afastava todos que tornaram-se dependentes das suas verdades.

O peso de medos, anseios, dúvidas, todos findados em seus ombros. Deveria aprender a lidar com isso, mas até lá cortaremos o mal pela raiz, pensou. E a partir de então evitava os conflitos, segurava seus conselhos pra si e ao ouvir algo imaginava-se transparente como o evento, tentando dessa forma que os problemas o atravessassem sem se deter em seu peito.

 

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Agressão

Vai, soca minha cara! Chuta minha barriga! Atira em mim, VAI!

Você não percebe que a cada tapa, soco ou lampadada que desfere contra mim, você está agredindo a sí mesmo? Ainda não entendeu que você tenta matar em mim a parte de você que te assusta? Está com medo do que?

Você não passa de um menino assustado, teme o que não entende.

Eu tenho pena de você.

Lamento que você não possa ser você mesmo. Se eu pudesse te pegar no colo e acolher toda essa angústia que alimenta seu ódio eu faria, mas não existe no mundo alguém capaz de lidar com isso além de você mesmo.

Esse seu ódio é responsabilidade sua e enquanto você não enxergar que quem está preso contra a parede se debatendo é você e não eu… Esse sentimento não vai passar.

Você não tem o direito de levantar sua mão pra mim.

Me matar não vai matar quem eu sou em você.

Simples assim.

Por isso você pode tentar me bater, me chutar e até mesmo me espancar.

Que ninguém, nem você, vai me dizer como amar.

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Desejo

Silêncio. Você está num lugar cheio de pessoas que conversam, bebem e se acariciam. Seus olhos só existem quando focam nos olhos do outro.

Você respira pelo nariz, enquanto o sorriso, originado da conversa entre os olhos, se ruboriza e demonstra em milésimos de segundos o desejo pelo outro.

Sua respiração segue lenta enquanto você disfarça, seus amigos mexem a boca de uma forma engraçada, mas você não entende uma única palavra. Volta seu rosto a procura do outro. Aqueles olhos, aquele sorriso, aquele corpo… Sua pele se arrepia e o espaço dentro da sua cueca é preenchido.

Olhos se cruzam novamente e passos são dados. Aproximação. A mão que vai no ombro na desculpa de falar no pé da orelha, o lábio que se morde ao ver a boca do outro abrir e fechar em gestos vocálicos, a risada interessada que joga a cabeça pra trás para evidenciar o pescoço e o cheiro do outro se misturando com o seu. Saliva. Um lábio que vai no outro. Um braço que envolve a cintura. Um abraço que enreda os ombros. Desejo.

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Cacto

Cacto,
Suculento espinho.
Feridas crescem como novas partes do seu ser.

Raizes grossas,
Resiliente planta.
Mudanças bruscas não te impedem de viver.

Areolas fortes,
Sustentam seus espinhos.
A todo ser é dado uma estrutura de defesa.

Mas ainda assim,
Dentro de seu corpo forte,
Guarda a riqueza do que lhe falta em volta.

Seus lábios machucam, mas a sede do seu beijo não termina.

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Um encontro despretensioso

Foi um encontro despretensioso, assim como o lugar escolhido, o Igrejinha, um bar na Fernando de Albuquerque, quase esquina com a consolação. era um espaço iconoclasta com luzes baixas e música alta.

Não era a primeira vez que ia naquele espaço, inclusive conhecia um dos garçons, um moreno alto, com sorriso simpático que além de pegar os pedidos flertava com todos e todas que ali frequentavam.

A conversa era boa, pelo menos isso, tinha saído com tantos caras com um papo meio bosta ultimamente, ou então homens que só falavam de trabalho, assunto gatilho para se lamentar, era muito bom ouvir e ser ouvido. Falaram de cinema, séries, tatuagem e etcetera. Ambos estavam interessados um no outro, mas era um interesse contido, discreto.

Pelo menos até o primeiro beijo. Foi faísca na certa. Riam, se acariciavam e aos poucos o que estava contido foi desabrochando, alargando, tomando conta do espaço, até o momento que o único caminho possível era o quarto.

O sexo começou no caixa mesmo, se encoxavam enquanto pagavam a conta. Depois a caminho do metrô beijos intercalados por passadas de mão rápida por entre as pernas, as bundas que pediam por agarrões e os lábios que se mordiscavam mesmo quando estavam separadas, cada um de um lado do vagão do metrô.

Quando chegaram no quarto não tinha espaço pra mais nada além da doce animalidade da qual fingimos domar. Cederam enfim a tentação das bocas cruas, ele mergulhou no poço escuro e tocou fundo o pomo que não era o de adão. Lhe cuspiu na boca e meteu com força. Ficaram ali por horas a fio. Gemidos em esse com som de xis, ele gostava muito disso.

Era um bom enamorado aquele, não fosse o fato de morar em outro estado, seguiram conversando e aguardam ansiosos até o próximo motivo para escrever outra crônica.

Dedicado a R.D.

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