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Nome da Coisa Posts

Vida Imaginária *

Xavier Dolan
Havia chegado à França naquele mesmo dia, deixei as malas na república que logo se tornaria meu lar. Após a socialização com os outros moradores resolvi dar uma volta pela cidade. Era outono em Paris, o vento soprava forte, fazendo com que as flautas doces na mão das crianças parecessem tocar sozinhas.
Andava sem pretensão alguma, andava valorizando o sonho tão desejado que se tornara realidade. Após quase uma hora e meia de caminhada com o vento cortante batendo no rosto, resolvi parar naquele charmoso café na Rue St Honoré. Sentei-me sozinho, pedi um Tarte Tartin e um expresso gourmet. Degustava-me com a sensação de liberdade que nunca foi minha. Respirava aquele aroma com um sorriso leve de criança a me tomar os lábios. Olhei para lado.
No fundo do café uma mesa agitada, aquela língua rápida e afiada que eu pouco conhecia. Definitivamente eu estava na Europa, o falar agitado com as mãos, as gargalhadas sonoras, os goles de café e o cigarro a descansar no cinzeiro. Tomei coragem, a coragem de um viajante sem passado e sem futuro. Fui até a mesa. Todos ali pareciam ter a minha idade e perceberam a minha chegada, não demorou muito e aquela levantada de cabeça revelará um rosto familiar.
Demorei a me lembrar de onde conhecia aqueles olhos, aqueles lábios, a curva daquele pescoço. De repente como num baque surdo me percebo na frente de Xavier Dolan e seus amigos. Fico ligeiramente sem palavras. Acabo por emitir um sonoro “Sorry!”. Ele sorri do meu jeito desajeitado e eu sem perceber sorriu, respondendo aquele gesto. Disse que o conhecia que adorava seu cinema e seu jeito de ver as coisas. Compartilhava de algumas fotografias que ele valoriza em seus trabalhos. Ele sorriu novamente e o “merci” tomou conta de meus ouvidos. Disse até logo e voltei ao meu lugar, tomei um gole tão grande de café que senti meu tórax queimando por dentro. Enquanto disfarça a dor que o café quente me proporcionará senti um leve toque no meu braço. Era ele. Sorrindo novamente, me informou de uma festa que fariam mais tarde, me passou o endereço e anotou meu telefone. Fiquei sem jeito, pois não conhecia ninguém, ele colocou a mão nas minhas costas me deu um beijo em cada bochecha e disse ao pé do meu ouvido “vous me connaissez”.

Naquela noite, perdido em meu primeiro dia em Paris, me vesti com meu jeito brasileiro de ser e fui a tal festa. 

* O título “Vida Imaginária” faz referência aos devaneios internéticos de René Piazentin e ao filme “Amores Imaginários” de Xavier Dolan.

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São Paulo

Foto por Leco Vilela

 
Existe alguma coisa em São Paulo que me expõe de uma forma suave, mostra minha história e cada história de sua longa vida.

Existe algo nesse ar, nesse vento. Talvez seja o dióxido de carbono misturado com o ozônio do fim da tarde, ou talvez seja só a minha pele que o vento toca diferente.

Imagina que cada janela acesa durante a noite tem sua história, seu conto, sua crônica. Eu imagino, e nesse exato momento uma mulher está fumando um cigarro, repousada na janela de um apartamento no centro.

São Paulo é terra de santo, mas com seu inferno particular, talvez seja essa a dicotomia que me agrade tanto, ou talvez seja só o vento que a minha pele insiste em sentir diferente.

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Uma carta para o céu

Foto por Leco Vilela

Olhar pela janela se tornou um hábito engraçado para mim. É que o céu ultimamente tem brincado de aquarela, pena que São Paulo é um potinho impermeável e não aceita a água que escorre do pincel. Uma ou duas pinceladas e pronto o pote já está cheio d’água.

Ah que bom seria se junto com essa água toda viesse um patinho de borracha, e que a água fosse limpa ao ponto de eu abrir a boca pro céu e me colorir por dentro, mas sabe como é que é né! Água com muita tinta, mistura e fica cinza.

E em quanto o céu brinca de se pintar em nuvens, as pessoas aqui embaixo brincam de chover pelos olhos, pois sem querer o céu jogou o potinho cheio d’água com tudo dentro pelo ralo.

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Canibalismo

Respiro, em tempos sem umidade essa é uma tarefa difícil. Abro a janela em busca de ar, o vento bate suave e frio no meu rosto. A noite parece fria, mas mesmo assim meu corpo sua.
Em gotas sinto o calor descer a espinha dorsal do meu corpo, provocando um arrepio estranho. É nessa hora que o mocinho deve acender seu cigarro?… A cena pede isso.
Confuso deixo a janela aberta e vago com meu corpo nú pela casa, olho dentro da geladeira e não encontro nada que me encante, que alimente essa necessidade de algo sem cor e sem nome. Talvez, mas só talvez eu não queira nada. Talvez, mas só talvez eu queira eu. Eu queira vivificar meus sonhos e anseios.
Falta-me coragem e o suor continua a me correr nas costas, aumentando a minha necessidade de mim mesmo, quero comer-me.
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O Discodante

O post de hoje será dedicado ao Dia Mundial de Combate a AIDS
 
“Homem, mulher, gay, lésbica, hetero, bi e travesti, não importam as siglas. Ela não escolhe barraco ou residência, cor ou tendência e quem dirá credo ou prepotência.

Imprudência não é amar, imprudência é negar a existência. A sua existência. O caminho mais rápido para um fim é assumir o silêncio que cada célula do seu corpo grita. Imprudência não pode ser amar.

Nesse conto de fadas moderno o vilão é interno e imortal. A espada mágica não existe e Merlin se perdeu no tempo. O que fazer com os devaneios de uma vida? Nossa queda é eminente, a diferença é que nesse grande tabuleiro sua rainha está em cheque.

O dia segue e a noite chega. Veste sua armadura pra poder amar sem medo. Sem receio do veneno que escorre do teu corpo. Desarmado não temo o beijo. Ser discordante nesse caso é opção. Confiança de que meu corpo para você continue imaculado. Nossa troca de sentimentos não envolve seus fluídos, as partes eternas que não se unirão sobre o abraço vigiado dela. Ela existe, assim como a fruta mordida do seu passado. Sua saliva ácida queima minha pele e mesmo assim te quero. Bomba relógio. BOOM
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